A realidade atual do mercado imobiliário de Portugal está cada vez mais assustadora. Quem aqui não sofreu dificuldade de encontrar uma casa em condições, especialmente quando se trata de se encaixar no orçamento familiar? Com preços exorbitantes, o arrendamento nas grandes cidades (e até suas periferias) torna-se cada vez mais difícil. E, com isso, muitos têm optado por investir na compra de um imóvel – mesmo que seja algo momentaneamente mais complicado – do que gastar rios de dinheiro em aluguéis que não oferecem nenhum retorno futuro. Eu fui uma dessas pessoas. Aqui vou te contar um pouquinho mais sobre o financiamento a 100% em Portugal, dar as dicas para que corra tudo bem e os alertas que tu deves ficar mais atento.
Como funciona o financiamento a 100% em Portugal?
A primeira coisa que posso adiantar, que vai fazer toda a diferença na saga, é ter paciência. O processo de financiamento a 100% em Portugal é árduo e, normalmente, é um sucesso apenas depois de algumas tentativas e erros. Mas lembrem: experiência é aprendizado!
Em Portugal, o financiamento a 100% dá-se, basicamente, à imóveis de retoma de banco. Essas são casas, apartamentos, armazéns ou até lojas que foram hipotecadas e os donos, por qualquer motivo, não cumpriram com o pagamento. As prestações são como um aluguel, que vão sair automaticamente da tua conta corrente numa data fixa, juntamente com outras taxas que já já explico. Uma vez que se deixa de cumprir com o pagamento de um determinado número de mensalidades, tu deixas de ser proprietário da casa e o banco toma o imóvel de forma a reaver o dinheiro.
Se existem outras maneiras de fazer um financiamento a 100% em Portugal? Sim, existem. Porém, elas deixam de ser um financiamento imobiliário a 100% e tornam-se dois tipos de empréstimos diferentes, com taxas e prazos diferentes, o que demandam uma taxa de esforço muito mais alta do que apenas um tipo de financiamento.
A taxa de esforço (podes mesmo gastar esses dinheiros, sr?):
Agora tu estás te perguntando: taxa de esforço? Que?! É, basicamente, a porcentagem que tu podes gastar da renda do teu agrupamento familiar (a galera que mora oficialmente contigo e contribui nas contas) para bancar os custos do financiamento. Quem determina essa porcentagem é o banco, de acordo com a política interna. Entretanto, em 2018 o banco de Portugal passou a recomendar que os bancos não permitissem que a taxa de esforço excedesse os 50% do financiamento mais outros créditos, tentando prevenir em relação ao que já aconteceu no passado – muita gente se endividou com o peso dos créditos habitação, deixaram de pagar e boom! Rombo nos bancos.
A minha vivência foi com a Caixa Geral de Depósitos, igualmente conhecida como CGD, que também temos no Brasil. Sempre quis ter uma casa própria, particularmente pelo investimento e pela liberdade que é não estar dependente da decisão de terceiros – no caso, o senhorio, dono do imóvel alugado.
Sabem a parte da paciência? É aqui que ela entra. Como comprar um imóvel não é uma decisão que se toma às pressas e tu não vais comprar qualquer coisa só porque está disponível, tem-se de ponderar e estudar caso por caso. Eu queria um imóvel com características bastante específicas. O que pegava mais para mim era a localização, que precisava ser próxima do metro por não ter transporte próprio (não conheces nadinha do Porto e tás querendo dicas de onde morar? Esse post aqui vai ter ajudar, oh).
Outro ponto super importante era o estado do apartamento, visto que os imóveis disponíveis na CGD precisam de obras estruturais, o que implica em um empréstimo em separado para as obras caso tu não tenhas um pé-de-meia gordinho – que é o caso da maioria das pessoas que buscam apartamentos de retoma. Lembrando que esse empréstimo seria o empréstimo de Reabilitação Imobiliária – Habitação, que, no caso de ser contratado na aquisição do imóvel, tem a TAEG reduzida para 2,8% | 2,3% e o montante mínimo do empréstimo é de 5000€. Isto tu podes calcular aqui.
Imóvel escolhido, o que preparar?
Depois de dois anos casualmente entrando no site da Caixa Imobiliário, encontrei um apartamento que atendia as minhas necessidades. Eu contactei o banco para fazer a simulação de crédito, uma vez que estava decidida em seguir em frente, e também enviei pedido de contato ao responsável pela venda do imóvel (esta informação tem na página do imóvel). Ao fazer o contato com banco, vale já se antecipar e ter em mãos estes documentos:
- O valor e rendimento (IRS) do último ano
- O número fiscal (NIF )
- A referência do imóvel (encontrada na página do imóvel do banco) e o link
- A declaração de IRS
- A nota de liquidação do IRS
- Os três últimos recibos de vencimento
- O contrato de trabalho
- O Cartão de Cidadão/Bilhete de Cidadão (caso tenha nacionalidade) ou a informação sobre o visto de permanência; se é temporário ou permanente
- Comprovante da morada atual (conta de luz/gás/água no teu nome)
Os três primeiros tu já envias de cara no primeiro contato com a agência. Eles vão te responder e, uma vez que tenham feito a simulação do valor do imóvel baseado com o teu último IRS, então vão seguir para os próximos passos e te pedir toooodo o resto. Se, como eu, tu tiveste um aumento/promoção durante o ano e isso escapou o IRS do ano anterior, manda também que eles podem basear a proposta no teu salário atual, não no anterior. (Eu enviei os três últimos vencimentos, como pediram, e assim que saiu o mais recente, com o ordenado novo, eu mandei mesmo sem eles pedirem. Me confirmaram que era informação válida sim.)
A declaração do IRS e a nota de liquidação do IRS tu encontras nas Finanças online usando o teu login. Os recibos, se tu não tiveres no teu email ou impressos, podes pedir ao RH da empresa ou à equipe que trata dos pagamentos e eles vão cuidar disso pra ti. O contrato de trabalho igual.
Eu sei, também fiquei desesperada e mais tonta que barata doida.
Oficializando a proposta de compra com o banco:
Uma vez que é tudo enviado e o teu crédito é aprovado dentro da taxa de esforço, é seguir ao próximo passo: tu farás, formalmente, a tua proposta ao banco. Ou seja, não, meu senhor ou minha senhora, tu não irás pagar o valor anunciado pela casa. Tu farás uma proposta acima daquele valor (sejam 50€ ou 500€), através do preenchimento da Proposta de Aquisição (Pessoal Singular). É um documento enviado pelo próprio banco em que tu colocas os teus dados pessoais, os dados do imóvel que queres comprar, os documentos que já enviaste (ou estás enviando) e, finalmente, a tua proposta.
Há sempre a opção de oferecer um sinal. A mim sugeriram 10%, assim o banco financiaria os outros 90% da compra. Caso qualquer outra pessoa fizesse uma proposta sem sinal eu estaria em vantagem, mesmo tendo feito uma proposta abaixo do valor que fizessem, porque os bancos têm mais interesse em dinheiro imediato, não à prazo. Por exemplo, uma situação hipotética: o imóvel está anunciado por 100 mil euros. Tu te comprometes a dar uma entrada de 10 mil euros, o banco te financiaria os restantes 90 mil euros. Caso outras propostas ofereçam 110 mil euros sem entrada, 120 mil euros sem entrada, a tua proposta ainda vai ser mais vantajosa ao banco, porque mal tu assines a escritura, eles já receberão 10%, ou seja, 10 mil euros, ao invés de 300, 400 no próximo mês.
Ah, tem também mais isso! Uma coisa boa nessa história toda é que o pagamento da primeira mensalidade do financiamento é só um mês depois de tu assinares a escritura. Dá direitinho para organizar as contas. Pelo menos isso porque, rapaz, senta que agora eu vou contar dos gastos uma vez que a tua proposta foi aceita e o teu crédito aprovado. (Porque eles refazem a simulação do teu crédito com o valor da tua proposta, tem esse detalhe.)
Os (muitos) gastos iniciais:
Como é um imóvel que vai ficar sendo pago entre 30 a 40 anos, um imóvel de financiamento, a tua casa/apartamento vai ficar no teu nome e no nome do banco. Se tu não pagares, o teu nome é apagado e segue em frente! A casa é só do banco. Por isso, por ter uma pessoa particular e uma empresa, os custos são em dobro. Ai ai ai… São duas escrituras (eles chamam de Documento Particular Autenticado), mais o IS (Imposto de Selo Sobre Mútuo, equivalente a 0,6% do valor financiado) e o IMT (Imposto Municipal de Transmissão, equivalente a 0,8% do valor do imóvel). Isso é pago no ato da assinatura, no escritório, através do Multibanco. Podes simular o IMT e o IS aqui. Além disso, a CGD cobra umas pequeninas taxas (eles não são bobos): a Comissão de Formalização e a Preparação de Documentos Contratuais.
Estando tudo assinado e tudo aprovado, tu vais agora ao banco assinar a papelada presencialmente. Força no pulsinho porque é bastante papel! Tu podes ou não repassar para a CGD a tua conta ordenado. Caso não passes, há um aumento na TAEG (Taxa Anual Efetiva Global). Particularmente, como eu já não pagava comissões ao banco anterior, mantive ambos e passei o meu salário para a Caixa para que não fosse “penalizada” por isso. Pago cerca de 4€ mensais pela gestão da conta e é isso. Não diria que em questão de taxas está me afetando grande coisa no dia-a-dia.
Seguros Obrigatórios – Vida e Habitação:
Sobre custo de seguro de vida, ronda cerca dos 10 a 15€ mensais para um jovem adulto saudável. Já o seguro Multi-riscos de Habitação é pago anualmente e vai depender da cobertura adquirida, do tamanho do imóvel e da localização. (Se tu queres comprar, mas estás mais perdido do que cego em tiroteio sobre onde mais vale a pena, dá uma bizoiada neste post sobre as cidades de Portugal!). Lembrando que a qualquer ponto podes alterar a companhia do seguro. Só não esquece de conferir no teu contrato de financiamento se há algum aumento para isso. Caso não haja, eles não podem te penalizar, como explica esta matéria da DECO.
Vais abrir uma continha na Caixa. Como dito, vais passar ou não o teu salário para lá. Vais receber, em casa, o cartão multibanco (débito) e o de crédito – este último demora um pouquinho mais para chegar. Lá no banco mesmo vão te dar os PINs dos cartões. Tu também vais assinar a documentação relativamente ao seguro de vida e ao seguro do imóvel. Ambos são obrigatórios, já que nenhum banco quer correr o risco que algo aconteça ao teu património (que também é deles até tu acabares de pagar, néam).
Supostamente a seguradora dá ok em tudo (a não ser que tu tenhas algum problema de saúde). No meu caso, eu mencionei minha asma, sendo que eu nunca mais tive crises e, ainda assim, tive problemas. Me enviaram um documento a assinar pelo meu médico, eu fui correndo ao médico particular, consegui assinatura e tive de reenviar ao seguro. Só então recebi o “ok, tudo certo pra escritura”. Tudo às pressas pois tínhamos a data marcada no escritório particular.
(Milésimo) Passo final para a compra da tua casa:
No banco mesmo, de acordo com a disponibilidade do escritório particular, eles irão agendar a data da tua, tão sonhada, aquisição. Tu não terás de levar nada além do teu nervosismo, teu documento de identificação e o teu cartãozinho de débito que será dilacerado (por uma boa causa!). O banco trata de levar a documentação necessária para finalizar o seu financiamento. Lá, confirma tuuuudo: fração do imóvel, endereço correto, o teu nome correto (comigo, erraram a digitação do meu sobrenome, eu só vi em casa e me bateu o desespero da ansiedade), valores etc. Serão feitas três transações, todas relativas aos impostos que eu mencionei anteriormente. Vão te dar as chaves e plim! Parabéns, mais novo sr. proprietário. 🙂
(Literalmente eu quando me deram cinco molhos com sete chaves de todas as cópias que todo mundo tinha.)
E tu, já pensaste em comprar a tua própria casa? Sabes de outros bancos e agências que oferecem o financiamento a 100% em Portugal? Conta para esses futuros-proprietários aqui!