Estudar e se bancar: essa é uma tarefa que muitos de nós temos. Muitos mesmo! Quem dera se todos nós pudéssemos ser custeados por nossos pais, tios, avós, amigos, qualquer pessoa que tenha condições de o fazer (um agradecimento especial a todos que podem fazer isso!). Mas a realidade, caro leitor e amigo, não é essa. Por isso, precisamos colocar alguns pingos no “is”. Veio para Portugal estudar e sua categoria de visto não te habilita a isso (mestrado)? Calma que nem tudo está perdido!
Como dissemos no post sobre 10 coisas que você precisa saber sobre o mestrado em Portugal e no post sobre o visto para estudo, apenas o visto de estudo (D4) NÃO te autoriza a trabalhar em Portugal. O que falaremos aqui é sobre a autorização que pode ser concedida pelo SEF para aqueles que quiserem trabalhar (e que só é liberada mediante análise do contrato).
Recebemos muuuuitas mensagens do tipo: “Camila e Cibele, vou fazer o meu mestrado em Portugal, mas ouvi falar que não posso trabalhar, e agora?”, “Camila, você pode trabalhar com o visto para o mestrado?”, “Meninas, como faço para poder trabalhar estudando no mestrado?”. Sabe o que todas essas perguntas tem em comum? O desejo de poder trabalhar. Seja para bancar os custos do mestrado, seja para pagar o aluguel, não importa. Trabalho aqui é a palavra chave.
Por isso, em colaboração com a nossa leitora Valéria Silva, vamos te ajudar a esclarecer essas e outras tantas dúvidas. A Valéria faz mestrado e acabou de passar por esse processo de “mudança de visto”. Na verdade, a Valéria solicitou a autorização de trabalho para estudantes com autorização de residência superior à 1 ano (visto D4). Mas antes de explicarmos direitinho sobre o processo dela, você precisa saber que:
- Para trabalhar legalmente, você precisa estar amparado por algum sistema. Para trabalhar com um contrato, por exemplo, você precisa ter o seu título de residência em Portugal. Escrevemos um guia completo para fazer o seu título de residência para fins de estudo. Sem ele e apenas com o visto de entrada, você não pode trabalhar com contrato, pois é tratado como um turista.
- Se você não puder esperar pelo seu título de residência, uma solução paliativa é o chamado Recibo Verde. Para trabalhar com o Recibo Verde, você deve abrir uma atividade nas Finanças para que possa trabalhar como autônomo. Você tem algumas vantagens trabalhando com o Recibo Verde como: ficar isento de qualquer imposto/recolhimento durante um ano; a atividade nas finanças te permite inscrever-se na Segurança Social (o que é muito importante para o processo de contrato de trabalho futuro); e você pode fechar as atividades à qualquer momento sem multa (coima em português pt); MAS você fica obrigado a declarar IRS em Portugal. Além, claro, de ser uma opção para você se apresentar ao mercado de trabalho português e fazer com que os empregadores te conheçam. Foi assim que a Valéria conquistou seu primeiro emprego com contrato em Portugal.
A Valéria respondeu algumas perguntas que vão te ajudar nesse processo, além claro, de compartilhar com a gente um pouco da experiência dela nessa passo-a-passo:
Valéria, o que você fez assim que sentiu a necessidade de trabalhar?
Como ainda não tinha o cartão de residência, a solução que encontrei para contornar o problema sem fazer algo ilegal foi abrir atividade nas finanças e trabalhar como autônoma (o famoso Recibo Verde). Logo que abri atividade nas Finanças, fui em busca de trabalho. Não é fácil…é muito frustrante, pois os empregadores não querem se arriscar à esperar pela sua “legalização” perante o SEF. Tentei durante cinco meses a área administrativa, e as únicas vagas que me chamavam eram telemarketing ou comercial porta-porta. Fiz até um part-time de dois meses numa empresa dessas ajudando à contratar comerciais, mas preferi sair por não concordar com as políticas deles. A necessidade então me fez buscar, literalmente, “qualquer coisa” que fosse estável e que eu pudesse me manter aqui. Ou era isso, ou eu desistia do mestrado e voltava ao Brasil.
Certo, depois disso você conseguiu alguma vaga de emprego?
Então, sim! Surgiu a oportunidade de trabalhar como extra em um restaurante na baixa do Porto. Não havia contrato nem nada, e mesmo com os Recibos Verdes o meu chefe nunca pediu para que eu emitisse. Ia duas a três vezes por semana e cobria folgas ou faltas dos outros funcionários do balcão. Mas o horário era pesado: eu trabalhava num único dia pelo menos 11h (não seguidos. Era almoço e jantar). Nesse tempo, tratei de abrir minha inscrição na Segurança Social. Demorou, como é óbvio, porque a SS implica com estudantes que queiram se inscrever lá, mesmo tendo o direito com base nos Recibos Verdes. Foram quase 2 meses, mas saiu. Também tratei de pedir o Estatuto de Igualdade de Direitos e Deveres no SEF logo que minha residência saiu. Cheguei um dia cedo no CNAIM, pedi informações e perguntei se poderia ser encaixada para solicitar o Estatuto. E sim, deu certo e eu tive muita sorte 😀
Nossa! Que doideira essa demora, mas a gente entende. Burocracias e mais burocracias que nos perseguem. Infelizmente, faz parte, né?! Mas você ficou trabalhando com Recibos Verdes por muito tempo?
Não! Três meses depois, surgiu uma vaga para trabalhar à contrato na cozinha. Foi quando surgiu meu segundo obstáculo: como conciliar o mestrado com o trabalho? Não queria desistir do curso (por questões óbvias) e também precisava do emprego. Então negociei com meu chefe que ele encaixaria minha folga no dia em que tivesse aula, e ele topou.
E como você fez com os horários das aulas do mestrado?
Ainda com Recibos Verdes, fui até a UPorto e solicitei que meu regime fosse alterado de integral para parcial, através do Estatuto de trabalhador-estudante. O pedido foi feito pelo Sigarra (da FEP) e eu anexei:
- Abertura de atividade nas Finanças;
- Cópia do Título de Residência;
- Comprovante da inscrição na SS;
- Declaração da própria SS dizendo que sou isenta de impostos por 1 ano.
A FEP deferiu meu pedido uma semana depois e, com o Estatuto, pude diminuir o número de cadeiras (que farei ano que vem).
Showde (abreviação nossa para show de bola 😛 )! E o que aconteceu depois disso?
Feito isso, comecei full time no restaurante. Em meu primeiro mês lá, meu Estatuto de Igualdade chegou e meu chefe o incluiu no meu contrato (o Estatuto vem com um código do processo e a data da publicação). Não sei ao certo, mas acho que o Estatuto influencia imensamente no processo de autorização de trabalho. A advogada do meu chefe também teve o cuidado de colocar uma cláusula dizendo que meu horário não interferiria no meu horário de estudo, e minhas folgas seriam em dias em que eu estudasse. O contrato veio no meu segundo mês de trabalho (normal, a maioria das empresas daqui fazem isso), e foi então que fui ao SEF solicitar a autorização de trabalho. Foi agendado previamente e eu aproveitei também para alterar minha morada.
O que é a autorização de trabalho para estudantes?
A autorização é basicamente uma chance de você poder trabalhar legalmente. Os estudantes que vem para fazer o mestrado, diferente dos que vem fazer doutorado, por exemplo, não possuem a autorização para trabalho vinculada ao seu título de residência. Para isso, o SEF amparado pelos artigos 58º à 62º da lei 23/2007, de 4/julho permite que este estudante entre com um processo de autorização de trabalho.
Quais os documentos são necessários para solicitar essa autorização de trabalho?
Contrato de trabalho ou promessa de contrato com horário de trabalho devidamente descrito (o meu não tinha, então meu chefe precisou fazer uma declaração contendo horas e dias de folga);
Inscrição na Segurança Social;
Residência válida;
Declaração da faculdade com o horário atual de aulas;
Formulário próprio para este fim (não sei se há no site, mas eles me entregaram quando fui fazer o agendamento).
Comprovante de morada (caso queira mudar o endereço, pois daí já fica atualizado).
Também pedi para que fosse incluído em meu processo a cópia do Estatuto de Igualdade, pois imaginei que isso ajudaria. Em momento algum o SEF disse que eu não poderia trabalhar enquanto não saísse o resultado, então eu trabalhei…fiquei com o comprovante do pedido em minha bolsa, caso houvesse fiscalização ou algo assim.
Algo que precisa ser melhor pesquisado é sobre o que diz o Estatuto de Igualdade, pois a carta que recebi fala o seguinte: “Permite o gozo, sem limitações diferentes das sofridas pelos portugueses, do direito de exercício de actividades económicas, do direito ao trabalho sem limitação quantitativa, do direito de desempenhar, também sem limitação quantitativa, funções nos órgãos de sociedades ou de quaisquer pessoas colectivas”. Essa carta é assinada pelo próprio SEF, mas quando fui lá perguntar à respeito, eles próprios não souberam me explicar o porquê dessa cláusula, apesar de nos obrigarem à pedir, mesmo assim, permissão de trabalho…enfim…
Quanto tempo demorou para que o seu processo fosse deferido e quanto custou?
O pedido demorou aproximadamente dois meses para ser deferido. Foi feito exatamente em 07/04 e voltei lá em 30/06 para pagar. A autorização custa 75,80€ e o cartão custa 38€. Total de 113,80€. Segundo a atendente, esse valor (o da autorização) não será mais cobrado, apenas o do cartão quando for renovado. E sobre a renovação, ela precisa continuar sendo feita anualmente (se você quiser seguir com a permissão para trabalho). O seu título de residência não muda para trabalho, ela continua com as obrigações da residência para estudo. Porém, caso você queira continuar com a autorização, precisa estar trabalhando à contrato e levar os mesmos documentos para a renovação (pode ser contrato de outra empresa). Também não há limitações quanto à carga horária do trabalho – você pode trabalhar até o permitido pela lei: 40h semanais. Pra finalizar, meu cartão chegou 24 dias depois. O número de residência muda e a mensagem de autorização vêm no verso. A data de renovação permanece o mesmo.
Acho que é isso 😊
Val, muito obrigada pelo seu depoimento e temos certeza de que sua experiência vai ajudar MUITA gente!
Gratidão por essa colaboração!